O Indie Lisboa apresentou este ano em sessão especial os dois primeiros episódios de “Sara”, uma serie de ficção de Marco Martins a partir de uma ideia original de Bruno Nogueira. A série representa a história de uma atriz conceituada, Sara uma mulher adulta com cerca de 40 anos, que todos admiram. Durante os dois primeiros episódios introduz-se o desenvolvimento da carreira da atriz e os sentimentos que esta vivência perante as obras que lhe propõem interpretar. Para além disso é também demonstrada a sua vida e rotina íntima.
A história de Sara foca-se na sua carreira como atriz de cinema que todos os realizadores adoram, devido ao facto de esta conseguir sempre promover uma profundidade trágica a todas as personagens que interpreta e principalmente pelo facto de ter a capacidade de chorar propositadamente. Todos estes aspetos são considerados maravilhas aos olhos dos realizadores até que chega a um momento em que o seu rosto seca e a actriz fica frustrada pela pressão exercida por parte dos mesmos, deste modo decide deixar de protagonizar o filme em que está a participar no momento, abandona as gravações e determina que a partir daquela altura só irá interpretar personagens de caráter mais vivaz.
Durante o desenvolvimento da narrativa assiste-se á vida da actriz por trás dos takes, esta apresenta-se desgastada de uma vida íntima liberal mas coincidentemente preocupante, um pai escritor, envelhecido e doente, do qual tem que cuidar todos os dias, dois únicos amigos, a melhor amiga onde se refugia e um homem com o qual tem casuais relações sexuais. Para além de todos estes aspetos encontra-se com os produtores do filme que desistiu de interpretar á sua porta constantemente.
Assim com todos estes problemas e questões existenciais Sara aborda o seu agente e expõe a visão que tem perante o momento que a sua carreira está a passar. Este agente é uma personagem diferente das que tinham sido apresentadas até ao momento atual da narrativa, ouve vozes, possui ideias peculiares e comporta-se de uma forma distinta do que é comum. Deste modo apresenta a Sara um novo projeto, uma novela. Inicialmente demonstra-se um pouco reticente em relação á proposta, mas mesmo assim empenha-se. Depois de uma reunião com o seu agente e com o produtor da novela apercebe-se que o intuito que tinham com a sua participação era o mesmo que os produtores anteriores, que Sara chorasse. Consequentemente a actriz procura terapia não convencional e solta a sua personalidade, conhecendo uma rapariga a quem mais tarde chega a dar aulas de teatro e com quem passa alguns momentos.
No desfecho deste segundo episódio da série, acontece algo extraordinário. Sara antes de se deitar finaliza uma conversa com os antigos realizadores do filme que protagonizada, afirmando que estes deveriam encontrar uma outra actriz para fazer o seu papel, alguém que chorasse e que conseguisse dramatizar do modo como estes idealizavam. Sara adormece e no dia seguinte observamo-la a levantar-se a realizar a sua rotina, no mesmo cenário e com a mesma imagem visual que em cenas anteriores, mas neste momento num corpo de uma outra mulher, mulher esta que encerra o episódio com lágrimas escorrendo-lhe pelo rosto.
Esta série apresentada no festival de cinema independente possui um carácter extremamente cómico e irónico, devido ao argumento e ás personagens com personalidades excepcionalmente fortes. Não só penso que sejam estes os principais aspetos que dão tanto valor á obra em questão, mas também o tema em si, o facto de a personagem principal ser uma mulher que é vista por algo que ela mesma não vê em si própria e a forma como se impõe num mundo onde ninguém lhe atribui a devida credibilidade. Além disso é também muito interessante a casualidade com que demonstram a sua vida mais íntima, o facto de ser uma figura pública e uma mulher reconhecida, mas que mesmo assim possui uma vida tão normal ou comum como todas as outras pessoas, não seguindo os ideais do que é um vida sublime, normalmente representada nos filmes em personagens como a de Sara.
