domingo, 27 de maio de 2018


"Hip to da Hop" - A evolução do movimento em Portugal e o papel da mulher no mesmo

“Hip to da Hop”, 2018, é um documentário dos realizadores António Freitas e Fábio Silva que esteve em exibição no Festival de cinema IndieLisboa 2018.
A dupla de realizadores percorre o Portugal de norte a sul na busca das diferentes manifestações da cultura Hip Hop no nosso país, focando –se nas suas quatro vertentes: o rap, o DJ, o breakdance e o graffiti.
Este é um documentário que procura mostrar a evolução de um simples movimento até ao ponto em que se encontra nos dias de hoje para que possa manter a excelência a que sempre nos habituou. Para isso somos presenteados com entrevistas dos maiores e melhores artistas do Hip Hop Nacional, entre eles, Sam the Kid, Mundo Segundo, Orelha Negra, NBC, Slow J, DJ Ride, Stereossauro, Bdjoy, TNT, Sanryse ou Sensei D.
A principal lição que este filme nos ensina é que as quatro vertentes do Hip Hop em Portugal não envelheceram da mesma maneira. O Rap, tornou –se na principal vertente, com o maior número de artistas e seguidores, podendo, nos dias de hoje, ser comprado ao Rock N’ Roll dos anos de ouro na segunda metade do século XX. Terá sido também a que sofreu mais alterações ao nível de produção, mas também ao nível do que significa para os seus ouvintes e na sua função social e politica, tendo perdido, na minha opinião, alguns dos seus atributos originais, nomeadamente a mensagem que deve transmitir. Hoje em dia o Rap demonstra a sua importância perante audiências em festas e eventos variados, e parafraseando uma das mais altas personalidades do Rap nos dias que correm, João Moura, antigamente os Dj’s tinham medo de passar Rap, hoje dia, o Rap atua como uma salvaguarda de qualquer DJ, se o público não está envolvido na festa e não demostra estar a gostar do que está a ouvir, o DJ recorre ao Rap para chegar ao coração dos seus ouvintes e assim devolver a animação ao evento.
O segundo grupo que mais cresceu nas ultimas décadas foram precisamente os DJ’s. Hoje, juntam grandes ou pequenas multidões, seja em pequenas festas ou festivais, arrastados para a ribalta provavelmente, pelo Rap.
O Breakdance terá sido a vertente que, em Portugal, menos se desenvolveu, é a menos conhecida, a que menos dinheiro gera e logo por essa razão, a que menos visibilidade tem, e a qual os seus artistas têm maiores dificuldades de subsistência devido aos poucos apoios que recebem. Tudo isto funciona como um ciclo vicioso no qual se uma determinado produto não gera o lucro esperado, não recebe a credibilidade e a visibilidade que merece, e logo aí é posto a um canto. Assim sendo deixa de haver investimento e logicamente, sem investimento não há criação.
Esta evolução toda só ganhou de facto, os contornos impressionantes que hoje observamos, talvez em 2009 com o rapper Regula, que terá aberto, ao mundo português, uma força de rap mais comercial, com sons mais balados e instrumentais mais mexidos. Assim a industria capitalista aproveita –se do Hip Hop, não só so Rap, mas também dos DJ’s para tornar o movimento em algo comprável e fonte de grandes lucros, que com o tempo nos fez voltar com uma força, algo perdida no inicio deste século, a um dos principais ideais do Hip Hop dos anos noventa, o de que o mais importante são: dinheiro, mulheres e drogas, uma imagem passada à semelhança dos gangsta rappers americanos, pelos novos Trappers e Mumble Mappers de todo o mundo.
Esta comercialização afetou todas vertentes, mas talvez tenha havido uma que se terá mantido mais intocável, no seu núcleo, apesar de ter crescido em membros e evoluído nos materiais usados como é natural, pois a evolução é também tecnológica. Esta vertente é o Graffiti, e foi a que menos se alterou com os anos, mantiverem -se os Writers e todo o seu conteúdo politico ou meramente de marcação de território, a necessidade de exibir a sua arte em prol de uma reputação entre outros artistas, com base na qualidade essencialmente técnica de uma tag, mas  talvez a maior diferença está na diferenciação no seio do graffiti entre writers e os novos street artists sendo que o último não pinta pela reputação de rua mas cria a arte pela arte, o importante é o belo e o enfeite, é mais pensado e geralmente de maior escala.
A visão do Hip Hop como uma industria permitiu então, criou a separação de cada uma das suas vertentes que hoje em dia atuam quase sem se interligarem, e a conclusão a que se chega é que estamos perante a extinção do Hip Hop na sua versão original, como dito pelo rapper de quarenta e seis anos, NBC, um dos primeiros no movimento, no decorrer do documentário.
No final do documentário, e perante uma sala do teatro S. Jorge cheia de artistas e apoiantes do Hip Hop nacional - onde poderíamos encontrar público de todas as vertentes e faixas etárias, pais e filhos, old school e new school  juntos com um sentimento em comum, o amor pelo Hip Hop,  que os realizadores proporcionaram uma conversa intima com os seus expetadores a cerca das suas experiências  e dificuldades e também com o fim de conhecer a visão do público e as suas experiências próprias. Nisto, ouvimos falar da plateia, Capicua, um dos maiores nomes do Rap português no feminino. É assumidamente feminista e membro do grupo As Capazes. A sua intervenção vai de acordo obviamente, com os ideais que defende e afirma que gostaria de ver num próximo filme, mais representatividade das mulheres do Hip Hop, pois neste documentário apenas uma mulher apareceu como artista.     
Desta afirmação os realizadores defendem –se com a dificuldade, legítima, de encontrar mulheres ligadas ao movimento em Portugal, pois não foi por falta de procura, foi porque de facto porque o número é muito menor. Mas quais são de facto as razões para este fenómeno?
A verdade é que o Hip Hop já não é visto como algo unicamente masculino como era no seu início, mas ainda mantém alguns estigmas em relação à mulher, principalmente no que toca ao Rap. Primeiramente, o maior obstáculo será a temática das musicas, é ainda muito machista, principalmente no seio dos new wave rappers, os trappers e os mumble rappers, ligados ao ideal já referido, em que as mulheres são quase vistas como um objeto meramente de prazer. Na maior parte das vezes, a mulher no hip-hop só tem direito a um papel secundário, é a dama que o rapper ostenta na música, a rapariga sexy que dança no videoclip. A maioria dos ouvintes não está habituado a ver a mulher no papel de rapper principal.
Outro entrave ao desenvolvimento do Rap feminino, é o facto de numa industria controlada maioritariamente por homens, muitas sejam desencorajadas a seguir o sonho de se tornarem MC’s graças à falta de visibilidade que têm no seio do “Rap Tuga” devido à falta, talvez, de ouvintes, mas também devido a contornos mais deploráveis por parte de alguns homens que usufruem de posições mais elevadas no meio, como o assédio. Quase como se houvesse a ideia de que para subir e sobreviver no Hip Hop a mulher tem que agir como objeto sexual e vender o seu próprio corpo.
Estes comportamentos são altamente deploráveis, e criminosos. 
Não é isto que o Hip Hop representa na sua essência. E, concluindo, o papel da mulher é tão importante como o do homem, Hip Hop é inspiração. Logo, da mesma forma que qualquer rapper homem, inspira cada um de nós das mais variadas formas, talvez tocando mais o coração masculino, pois este, em teoria irá se identificar mais com a vivência e a mensagem nas músicas dos mesmos. Ao mesmo tempo também as mulheres MC’s, têm o poder de inspirar a luta de todas as outras companheiras que ainda n atingiram o seu patamar. No final, é isto o Hip Hop em Portugal e no Mundo, é a inspiração, a luta, a igualdade, a troca de ideias e a evolução para uma vida melhor!