O ser humano vive de acordo com um conjunto de regras e comportamentos arbitrários que fazem sentido dentro da cultura em que este se insere e que são transmitidos de geração em geração, através da linguagem.
Esta partilha de conhecimento entre gerações é fundamental para a sobrevivência da espécie, já que o ser humano é um ser cultural, e por isso, depende dos ensinamentos da geração anterior para sobreviver. É através do poder que vem do conhecimento das gerações anteriores que aprendemos a procurar alimento e a escapar do predadores.
Segundo Michel Foucault, este poder assenta na busca incessante de conhecimento pelo ser humano, e assim, nas interações estabelecidas entre diferentes sujeitos, através da linguagem. Estas relações de poder atuam sobre os indivíduos de uma determinada sociedade como uma força de coação, disciplina e controlo. Assim, o biopoder não diz respeito aos orgãos que gerem uma sociedade (“Dizendo poder, não quero significar "o Poder", como conjunto de instituições e aparelhos que garantem a sujeição dos cidadãos em um Estado determinado”(1)), não depende de uma hierarquização desta, não é algo que se adquire, conquiste ou partilhe, é algo que está presente em todos nós, desde o momento em que aprendemos a falar e a comunicar.
Ainda assim, se partimos do princípio de que, numa sociedade, existem determinados mecanismos de poder, temos que aceitar também, que há elementos que o exercem e elementos que estão sujeitos a ele. O biopoder pode influenciar os corpos significantes uma vez que pode prolongar a sua vida (através de algo tão banal como campanhas de vacinação para a população), manipulá-la (através das alterações que, graças à evolução da ciência, agora são possíveis de exercer no código genético) ou até extermina-la, através de armas capazes de provocar mortes em massa.
Tome-se como exemplo o genocídio (geralmente definido como o assassinato de pessoas, deliberado e motivado por diferenças étnicas, nacionais, raciais, religiosas e/ou sócio-políticas com o propósito de exterminar os membros de um grupo específico) que ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial, também conhecido como Holocausto. Neste episódio que marcou a história da humanidade, milhões de Judeus foram assassinados pelos nazis, liderados por Adolf Hitler, nos campos de concentração e trabalho forçado, recorrendo a ferramentas como as câmaras de gás.
A partir desta cena surgiram inúmeros objetos de índole artística, muitos dos quais acabaram por se tornar ícones da cultura do século XX, como foi o caso dos filmes, “A Vida é Bela”, “A Lista de Schindler”, “O Rapaz do Pijama às Riscas” e do “Diário de Anne Frank”, entre muitos outros.
O “Diário de Anne Frank”, escrito por Annelies Marie Frank entre 12 de junho de 1942 e 1 de agosto de 1944, narra episódios da vida desta adolescente, da sua família e de uma família amiga, durante a época em que se encontravam todos escondidos num anexo do escritório do pai de Anne. Sendo judeus, fugiram para tentar sobreviver à perseguição nazi, mas pouco tempo antes do fim da guerra, foram descobertos e levados para campos de concentração. Entre estes, o único sobrevivente foi Otto Frank, o pai de Anne, que publicou o seu diário quando voltou a Amesterdão, onde a família tinha vivido. Assim, Anne Frank acabou por se tornar um símbolo universal contra a intolerância e deu rosto aos milhões de judeus que foram perseguidos e mortos no Holocausto.
Em suma, o poder está na base da cultura e o biopoder influencia grandemente a sociedade, tanto por um lado positivo, como por outro negativo, já que, com base no discurso é capaz de influenciar massas a agir de determinada forma. Como se pode verificar no exemplo do Holocausto, Hitler teve a capacidade de convencer a população alemã a perseguir e assassinar milhões de pessoas.
(1) - “História da Sexualidade I - A Vontade de saber”, Michel Foucault, Tradução de Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque, 13.a Edição