Algures no Médio Oriente, dentro do
deserto da Arábia e banhado pelo Golfo Pérsico, ergue-se a cada dia um oásis
artificial num ritmo frenético – a terra dos projetos proeminentes e
grandiosos, movida pelo sonho capitalista – Dubai. Esta terra, conhecida e “marketizada” como um paraíso idílico
povoado por palmeiras imensas, Maseratis,
camelos e o reflexo prateado e brilhante das suas emblemáticas torres, é assim comummente
apelidada como a geografia mais Ocidental do Médio Oriente, um título no mínimo
curioso, pela sua já evidente contradição.
Remontando ao início da relação entre o Ocidente
e o Oriente, a representação e mistificação orientalista do séc. XIX deste
último era essencialmente um discurso de separação que constituiu a nossa
identidade europeia, e ocidental. Ao apontar o outro como diferente, resta-nos
a compreensão do que é que faz o remanescente igual e, porventura, ocidental. Atualmente, com os fenómenos de globalização
e capitalização do mundo, a cisão cultural entre o Oriente e o Ocidente tem-se
desvanecido, e a cultura aceleradamente homogeneia-se por todo o mundo, em que
o olhar sobre o “outro” vai perdendo a sua outrora aura de exotismo e vai-se
assemelhando a um reflexo, tal e qual um espelho, do próprio indivíduo. O
mundo, esgotado de possíveis orientes, procura assim criar outros. O exótico
permanece.
O que motiva o turista ocidental a visitar
o Dubai é ainda uma incógnita para mim quanto à compreensão na totalidade desse
fenómeno e gosto, com o qual de certo não me identifico, no entanto, neste
mundo global em que reina a percepção de um total conhecimento sobre tudo o que
nos circunda, simultaneamente, parece existir uma perpetuação deste
desconhecimento relativo a quem nos é exterior. Deste modo, as narrativas sobre
o “outro” surgem ainda de forma imaginada e enigmática, fascinando-nos.
Talvez o prazer e o sentimento que nos
provoca o exótico seja inerente e também ele constante a nós, e nenhuma
proximidade ou rede o pode dissolver, ou talvez mesmo a necessidade romântica
de beber do exótico como abstração da realidade não seja tão exclusivamente
romântica assim, o que leva o Homem a, esgotado de possíveis exotismos, criar
novos e diferentes. No caso do Dubai, e nesta lógica, não
deixa de existir um certo gosto orientalista pelo ambiente único
artificialmente criado nesta cidade, e afastado da realidade, mas mantendo
algumas características orientais, sendo o seu foco não a sua orientalidade de
facto mas a orientalidade enquanto conceito – a evasão e o gosto pelos ambientes
deslocados da realidade; aquilo que está longe.
É, pois, uma realidade longe de qualquer outra
superpotência mundial porque é uma realidade que se faz única nos seus cenários
surpreendentemente irreais, quer pela aparente impossibilidade de existência
física que grande parte da arquitetura da cidade representa, numa hiper-verticalidade
e artificialidade do espaço - dividido entre os imensos arranha-céus (de
dimensões vanguardistas) e as várias ilhas criadas pelo Homem (tudo isto
erguido no meio de um deserto) - quer pela escala exacerbada em que decorrem os
negócios, o ritmo de construção, a vida, enfim, uma eterna promessa de “mais”
que consegue provocar o estranhamento (ou deslumbramento) até num cidadão de
Nova York ou Xangai. O deslumbre, por fim, de todo este Oriente bastante a
Oriente do que nos é conhecido culturalmente como o Oriente.