sábado, 30 de dezembro de 2017

Anjos e demónios: denúncia ou perpetuação de um olhar?


“Angel and Devil”
No contexto das suas campanhas publicitárias, a Benetton lançou a imagem Anjo e Diabo, em 1991/1992, contra o racismo e com o intuito de celebrar o fim do apartheid na África do Sul.
Esta campanha publicitária, como tantas outras da United Colours of Benetton, aparentemente pretende desmontar e confrontar o público com os preconceitos sociais.  
   Como podemos observar, a imagem contempla duas meninas que sorriem e se abraçam. Em seguida, percecionamos que uma das crianças é branca e que a outra é negra. Posteriormente, o nosso olhar desloca-se para os cachos doirados da menina branca e para as ondulações que lembram chifres da menina negra. Depois do olhar, vem a interpretação e, vemos “o abraço”, símbolo da amizade em que os estereótipos sociais se diluem. O abraço, supostamente pretende passar a ideia do combate à segregação, de que somos “todos diferentes, todos iguais”. Olhamos novamente, e vemos que a “menina de cachos loiros” simboliza um anjo e que a “menina com ondulações no cabelo que parecem chifres” representa o diabo.  Estamos perante a dicotomia entre o bem e o mal simbolizada pela figura angelical e pela figura diabólica, a denúncia de um arquétipo social alicerçado em pressupostos de positivação da pele branca e da negativização da pele negra, ou, como diria Barthes, a perpetuação de um modelo em que os meios de comunicação de massa agem pela reafirmação do status quo defendido pela classe dominante? Segundo Roland Barthes, o objeto artístico, a obra deve ser entendida como mecanismo produtor de sentido. Da mesma forma, na publicidade a significação da imagem é sempre intencional.

 À primeira vista esta mensagem publicitária parece-nos denunciar preconceitos sociais de uma forma absolutamente sincera, honesta e real, mas será este o seu verdadeiro significado? Apenas na sua des-construção e no reconhecimento de conceitos implicados na imagem fabricada por Oliviero Toscani, fotógrafo e publicitário da marca, e disseminada nos meios de comunicação, se além da provocação e da dramaticidade, as imagens denunciam e com isto convocam a consciência ou se a fotografia possui um carácter manipulador da opinião pública a favor dos interesses da classe que defende a conservação do mundo, a sua mitificação?