sábado, 23 de dezembro de 2017

A Ideologia das Obras de Arte


A IDEOLOGIA DAS OBRAS DE ARTE

Comentário à obra de Fredric Jameson, The Political Unconscious: Narrative as a Socially Symbolic Act, Routledge Classics, 2ª edition, 2002.



The Political Unconscious é uma obra difícil, mas não deixa de ser um marco na obra maior de FREDRIC JAMESON.
A sua dificuldades provém da posição de equilíbrio e, portanto, sofisticada que o autor tenta defender e ilustrar. Como refere, temos sempre razão em procurar apreender socialmente a obra de arte, de a interpretar em função dos contextos históricos e das relações sociais determinadas, situadas em segundo plano. Mas, actualmente, a riqueza de uma tal abordagem não pode ser defendida, a não ser com base numa consideração séria de teorizações alternativas, psicanalíticas, por exemplo, mas sobretudo estruturalistas (o autor cita Barthes e Greimas), porque são elas que radicalizaram a problemática legítima da autonomia do texto. Para ele, a obra é mesmo para conceber a partir do movimento possível da transformação activa da história, o qual nos convida a identificar o seu inconsciente político, isto é, o sentido para onde a História deve ir, mesmo que não seja de bom grado. Resulta de tudo isto uma posição particularmente complexa que, evitando quase nada perder das ciências humanas contemporâneas, toca, por vezes, o sincretismo.
Por um lado, é preciso, com efeito, manter uma certa primazia epistemológica da cultura e da narrativa. Nenhuma filosofia da história, nenhuma teoria globalizadora (como o “materialismo histórico”) é capaz de antecipar com autoridade  os efeitos  de uma interpretação das marcas singulares em que os conflitos e as tendências se exprimiram. Resumindo, somente a partir da literatura é que o sentido da História se revela. Mas, por outro lado, JAMESON não renuncia à ideia de uma legitimidade do marxismo, já que, como especialista de Sartre, não teria renegado a famosa fórmula do autor da Crítica da Razão Dialética a propósito do “horizonte intransponível do nosso tempo”. Nestas condições, o jogo de linguagem marxista (luta de classes, transformações induzidas pelas evoluções económicas, revolução) mostra-se redefinido como uma estrutura de acolhimento para as outras linguagens teóricas, quer provenham da psicanálise, quer das abordagens resultantes do estruturalismo linguístico.

O resultado principal desta posição consiste numa nova concepção de ideologia. Mais do que ao domínio das ideias, doravante passa a estar associada ao das obras de arte. A arte, em particular na literatura, não domina a sociedade, nem exprime somente situações de facto preexistentes. A ilusão não é o contrário da realidade, mas antes um espaço próprio à vida social de um presente histórico que manifesta, mais do que os outros, as suas ambiguidades, as suas riquezas inexploradas, os seus potenciais reprimidos, a força das energias que a percorrem e que a desmente ao mesmo tempo. “A ideologia não é qualquer coisa que venha informar ou investir a produção simbólica; ao contrário, o acto estético é ele mesmo de natureza ideológica, e a produção de formas estéticas ou narrativas deve ser entendida como um acto propriamente ideológico, tendo por função inventar “soluções” imaginárias ou formais às insolúveis contradições sociais”.