domingo, 24 de dezembro de 2017

Industrialização da expressividade

O cinema é dos médios artísticos mais fascinantes, com a sua inegável influencia na cultura popular mundial através de um legado centenário que tem vindo a desenvolver-se desde a sua concepção. Sendo actualmente considerado como a sétima arte, contrastando com a atenção que lhe era dada nos seus primórdios, é uma arte que através de diversas obras e diversos artistas, continua a surpreender e atrair um maior nível de seguidores. 

Embora a sua afirmação como arte, isto não significa que a intenção por detrás de um numero de peças de audiovisual tenha intrinsecamente uma visão artística como força condutora. O audiovisual é capaz de coisas incríveis que se mostram únicos ou de extrema dificuldade a outros métodos da expressão, de levar o espectador pelas mais diversas das emoções, ambientes e únicas viagens e sensações. Sinto que, através da minha experiência, produções onde os seus artistas cooperam para trazer a sua visão artística ao ecrã, resulta em algo muito mais memorável ao sentidos do que algo que não tenha sido depositado alma alguma. 
Porém, como vagamente supracitado o cinema ao longo dos anos só desenvolveu a tendência para ser industrializado. Não é como fosse um fenómeno plenamente actual; pelo contrário, embora seja verdade que é algo que só se tem vindo a notar nitidamente nestas ultimas duas décadas. Muitos defendem que esta tendência para a industrialização é algo que ameaça deteriorar a alma criativa que se encontra no médio, devido as condições que são impostas sobre os artistas, seja ao realizador, argumentista ou qualquer outra posição, para que a produção saia com uma maior probabilidade de sucesso comercial.

Verifica-se a necessidade da esterilização da arte, a favor do comércio. A que se deve esta necessidade? Obviamente, o interesse do público, que acaba por ser a fonte de rendimento dos produtores do filme, mas isto porque a maioria dos públicos valoriza mais cinema como fonte de entretenimento do que como meio de expressão, e que de forma alguma essa atitude seja vista como algo depreciativo, mas esta maneira de pensar é aquilo que tem sustentado em termos financeiros estes artistas e ao mesmo tempo lhes tem limitado o espaço de expressão.
Recentemente, e com o "zeitgeist" do sobrecarregar de informação, a atitude do público genérico desenvolveu-se numa necessidade de constante extravagância visual pois o público já não é tão impressionável e isto é perceptível apenas dando uma olhadela aos sucessos de bilheteira deste ano; muitos dos elementos comuns que se encontram nos "blockbusters" possibilita-nos o encontro facilitado com essas tendências, introduzidas para se adaptarem ao público-alvo. Desde o humor barato a cenas de acção desastrosamente ruidosas, o que reina é o desprendimento do espectador ao peso do universo do audiovisual para uma experiência fast-food de cinema. Exemplos podem ser encontrados em títulos como nas franquias financeiramente bem sucedidas de "Os Jogos da Fome" ou "Velocidade Furiosa", que tendo em conta a faixa etária que apela engloba elementos semelhantes.
Por outro lado, tomando consciência deste fenómeno, já não há dúvidas do surgimento de realizadores com um claro e soberbo aproveitamento das mecânicas de construção de um audiovisual na tentativa de conciliar o acessível com o artístico, impedindo a estagnação da inspiração e ainda assim considerando o rendimento da produção. A maioria da filmografia do realizador Christopher Nolan incorpora esta noção. 

Em contraste, e usando como exemplo o realizador Nicolas Winding Refn e o seu pouco sucesso com as grandes audiências em 2011 com o filme "Drive", o apostar numa maior vertente de expressão artística ao invés dos requerimentos procurados pelas pessoas atraídas pelo marketing que rodeava o filme resultou no descontentamento do publico para seguir se de uma consequente apreciação pela crítica e o aparecimento de fãs de culto que foram conseguidos pela compreensão das intenções da obra e, inegavelmente, resultando em algo muito mais memorável.