sábado, 23 de dezembro de 2017

Corpo Feminino

Ao longo da história o corpo feminino, enquanto possuidor de um “valor de uso”, foi sujeito a pressão e imposição social. Conforme a época histórica e a organização sociocultural a esta associada, os padrões de beleza associados ao feminino foram variando, proporcionando-nos a arte a possibilidade de aceder a essas sucessivas representações histórico-culturais do corpo da mulher. As mais ancestrais formas de arte relacionavam o corpo feminino com a fertilidade/capacidade de gerar vida, passando-se ao longo dos séculos a integrar outras caraterísticas e preocupações, nomeadamente a mutável noção de belo.
Em sociedades tradicionais e patriarcais, em que a mulher era reprimida e despojada da maior parte dos direitos de cidadania, o corpo feminino foi sendo apropriado como coisa, detentor de “valor de troca”, expresso em termos de riqueza (os dotes que as noivas traziam aquando do casamento, por exemplo) e como meio de procriação (gerador de filhos).
Nas sociedades contemporâneas ocidentais, após muita reivindicação e luta, as mulheres têm atualmente, a nível legal, os mesmos direitos e deveres que os homens e, aparentemente, a mulher passou de objeto a sujeito, com livre arbítrio sobre a sua vida e o seu corpo.
E, no entanto, atualmente, mantêm-se as pressões sobre o corpo feminino, que partem agora da sociedade de massas e dos media. Nas imagens que constantemente nos rodeiam, na publicidade, o corpo feminino surge cumprindo standars de beleza, perfeição, elegância, magreza, inalcançáveis pelas mulheres em geral. Esse corpo, porque é objetivado, continua a ser olhado como mercadoria. Muito raramente é representado como algo normal, que é visto por todos, todos os dias. Acrescente-se que de forma inédita, mas a uma escala muito menor, o próprio corpo masculino passa também a ser objetivado e sujeito a imposições estéticas.
Paradoxalmente se o corpo-objeto-mercadoria das imagens e dos media é encarado como algo positivo, desejável e desejado pela população em geral, quando é visto na vida quotidiana passa a objeto de crítica, de escrutinização, de análise e de inspeção. Este paradoxo perpetua “regras” sobre o comportamento e o aspeto da mulher em todos os aspetos da sua vida: sobre e sub-sexualização das mulheres, manutenção e reforço de preconceitos de género e adjetivação prejurativa, direccionada à sexualidade feminina.

Aplicando aqui, com as devidas distâncias, o orientalismo de Edward Said, percebemos que, no século XXI continuam a fabricar-se standards e ideais de beleza que correspondem a ficções se comparadas à vida real e quotidiana.