Karl Marx fala-nos da ideologia
como sendo “o meio pelo qual as ideias da classe dominante passavam a ser
aceites na sociedade como naturais e normais”. Mais tarde, Antonio Gramsci,
inspirado no pensamento marxista, introduz o conceito de hegemonia: entendido no campo da ideologia, “implica a constante
conquista e reconquista do consentimento da maioria em relação ao sistema que a
subordina”. Agarremos no programa “E se fosse consigo” da SIC, da autoria da
jornalista Conceição Lino”, e tratemo-lo sob o olhar destes dois conceitos.
O programa “E se fosse consigo”, segundo a SIC, “pretende focar-se em
temas como a tolerância, o respeito, o preconceito e a liberdade” e
"testar a capacidade de intervenção dos portugueses na defesa do outro”.
Vamos então esclarecer o formato do programa: é apresentado ao telespectador
uma situação fictícia entre o(s) “intolerante(s) e a(s) ”vítima(s)” em que é esperado que alguém que esteja a
passar intervenha e defenda a “vítima”; sendo que tudo isto é encenado em praça pública e que a pessoa que
intervém não tem a consciência que toda a cena não passa de uma encenação.
Nestas encenações são tratados temas como a tolerância, o respeito, o preconceito
e a liberdade utilizando variadas situações mais concretas como o bullying, a
obesidade, o racismo, a violência no namoro, a homossexualidade e a adoção por
casais homossexuais, a transexualidade, entre outros. Mas será que é este o objetivo
primeiro deste programa do horário nobre?
Concentremo-nos nestes últimos dois temas: a adoção por
casais homossexuais e a transexualidade. Fique desde já esclarecido que a
questão em análise não é o programa a nível formal que, na maioria das vezes, nos
consciencializa e educa, mas sim alguns temas que surgem quase que com uma
máscara de naturalidade. Temas como a adoção por casais do mesmo sexo e a
transexualidade, são assuntos tabu na nossa sociedade, temas que, de certa
forma, obrigam a pessoa a seguir os seus ideais. Perguntamos: “Qual é, afinal, a questão? Qual
a diferença entre estes temas e os restantes também abordados?” A questão está
na maneira como o tema é abordado, puxando sempre por um lado mais sensível do
telespectador. O tema, outrora tabu, torna-se algo totalmente natural e de
“opinião óbvia”. A necessidade do sentimento de compaixão e pena para com a
“vítima” que é transmitida conquista desde logo quem o vê. Aqui, o
telespectador perde a sua consciência para viver através da consciência de quem
domina (neste caso, o programa, devido a uma maior abrangência e impacto – é a
“classe dominante”). Os telespectadores perdem a sua liberdade, ficando presos
à liberdade do outro.
Desta forma, e como prevera Marx, a classe dominante, a
televisão, consegue manter os espectadores numa falsa consciência. O principal
objectivo é a criação de um pensamento homogéneo.
Referência:
MARX, Karl; ENGLES, Friedrich, A ideologia alemã, vol I. Lisboa: Presença, pp. 25-26
FISKE, John, Introdução
ao estudo da Comunicação. Porto: Edições Asa