quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

"Quem tem medo da Virgínia Wolf?" - recensão


"Quem tem medo da Virginia Wolf?" é uma peça adaptada da autoria de Edward Albee que recentemente fui assistir. Honestamente, não conhecia muito bem o trabalho dos atores que participavam desta peça, mas avisaram-me desde o início do seu calo e bom papel na profissão (Diogo Infante e Alexandra Lencastre), e, de facto, a representação veio a confirmar a veracidade da afirmação.
Falando da peça em si, sendo categorizada como humor negro, ela de facto envolve-nos de uma maneira muito intensa, mergulhando-nos no clima denso, quase agressivo que se forma a volta dos casais. A superfície ideal contrasta perfeitamente com o interior podre, conflituoso, demente da relação. A peça em si não apresenta artificialidades, ela é contada expondo uma situação que podia ser muito bem transposta para a realidade, desde o maior detalhe, com os temas da superficialidade aparente e felicidade ilusória e conflituosa, como já referi, até aos mais pequenos, a apontar as tentativas fracassadas dos jovens de fugir do casal mais velho, o envolvimento amoroso entre Martha e Nick, o desenrolar natural da narrativa, umas vezes mais lento outras vezes mais turbulento, as personagens em constante desconforto, desajustadas do meio, mas presas umas às outras.
Em relação aos protagonistas, o seu desempenho esteve além das minhas expetativas, em particular o casal mais velho. Se houve algumas artificialidades ao nível da representação, talvez tenham sido mais notórias ao nível dos atores mais jovens, em particular, de José Pimentão. Diogo Infante representou lindamente, com um sarcasmo sempre presente, movimentos firmes e naturais desde a sua calma controlada - no simples cerrar de dentes, no sibilar, no constante ziguezaguear pela sala para fugir à raiva iminente, nas respostas irónicas - às explosões agressivas e descontroladas. Alexandra Lencastre também desempenhou o seu papel com uma naturalidade notável, desde a embriaguez e felicidade falsa à fúria e desespero: ela atua como se fosse dona do papel. Lia Carvalho também se destacou aos meus olhos pela destreza com que desempenhou o papel da mulher sonsa, aparentemente demasiado ingénua e florzinha de estufa de Nick.
No geral, a peça surpreendeu-me a vários níveis e sugou-me para dentro dela. Recordo-me perfeitamente de ter ficado ainda suspensa, retida na história quando ela parou para intervalo. Foi uma representação deveras fascinante, que, de facto, vale a pena assistir.