Museu Calouste Gulbenkian
19 Outubro 2017 – 5 Fevereiro 2018
Curadoria: Maria Rosa Figueiredo com a colaboração de Leonor
Nazaré
Na exposição Do
Outro Lado do Espelho somos confrontados com obras de diversos
artistas. Como elemento temático destas obras está o espelho e a sua abordagem
iconográfica em diversos suportes artísticos (pintura, escultura, fotografia,
filme) desde o modernismo ao contemporâneo.
Para uma compreensão
mais clara e organizada sobre o papel do espelho, a curadoria divide as 69
obras que compõem a exposição por 5 núcleos:
«Quem Sou Eu?»: O
Espelho Identitário é
a premissa explorada na primeira divisão com diversas obras que abordam a relação
que temos com o espelho. Entre estas, é exibido o filme Syvato (2005)
de Victor Kossanovsky (1961) que me suscitou a atenção por ilustrar o
comportamento de uma criança ao ter o seu primeiro contacto com o espelho, uma
ideia familiar a todos. Achei promissor o filme estar a ser passado no início
da exposição, integrando-nos muito bem na temática explorada ao longo do resto
da sala.
Apresentada como O
Espelho Alegórico, a segunda parte da exposição leva-nos para o
universo da imaginação. Estamos perante um conjunto de obras cheias de
metáforas e signos alegóricos que nos levam a questionar: “O que está por
detrás do que os meus olhos são capazes de ver?”. É interessante notar a
escolha da obra de Paulus Moreelse (1571-1638), Rapariga com
Espelho, Alegoria do Amor Profano (1627), pois para além da figura
principal da pintura (a rapariga que remete intencionalmente para o prazer e
beleza), podemos retirar informação dos restantes elementos do quadro (o quadro na parede que representa um
episódio amoroso das Metamorfoses de Ovídio, e por um livro ilustrado com uma
mulher ajoelhada diante de uma imagem de Vénus, a deusa do amor profano).
Na terceira parte da
exposição: A Mulher em Frente ao Espelho: A projecção do Desejo, a
selecção de obras remetem para o conceito de intimidade feminina e de
descoberta do “eu”. A mostra de excertos de filmes do cineasta Ingmar Bergman
(1918-2007), na minha opinião, é um elemento muito a favor nesta parte da
exposição pois mostra, de forma sistemática, como o artista aborda a Mulher e o
seu confronto com o espelho (elemento de delicadeza, elegância, vaidade e até
terror) para falar da alma e do interior
feminino.
Na última parte da
exposição é apresentado o tema O Espelho Masculino: Autorretratos e
Outras Experiências, sendo a minha obra de eleição um quadro de Maurice
Lobre (1862-1951), A Casa de Banho de Jacques-Émile Blanche (1888),
esta obra ganha importância, na minha opinião, pelo facto da figura masculina
não estar lá, mas acabar por ser a personagem principal da obra. Outro fator
interessante é a relação entre os elementos pictóricos e a mensagem subliminar,
o interior do espaço é um lugar tratado com cores escuras (de onde a rapariga
sai), e onde aparentemente a única luminosidade que existe é proveniente da luz
exterior (local para onde a rapariga caminha). Esta ideia dá-nos a sensação de
que ela pretende “fugir” de alguma espécie de ambiente pesado e dirigir-se à
liberdade. O espelho acentua esta ideia de ambiente pesado como uma espécie de
expectativa e ânsia que nunca acaba.
Toda a exposição nos
envolve num ambiente de reflexão, em primeiro lugar porque conjuga obras de
épocas temporais muito distantes e isso faz-nos observá-las de maneira mais
consciente no que diz respeito à evolução da história de arte, ora estamos
perante obras da idade moderna em que o espelho é utilizado como fonte de
alegoria para um conjunto de significados e sensações que o artista pretende
expressar, ora somos confrontados com obras contemporâneas que desenvolvem uma
interacção com quem as observa, como estância está a presença da obra Espelho "NO" de Stefan Bruggeman, um espelho
grande com a palavra “NO” escrita com tinta de spray, este objecto faz-nos
confrontar com o “eu” e coloca-nos no papel das personagens pintadas nos
quadros que havíamos visto anteriormente, ou seja passamos de observador
(exterior à cena) para “dentro da cena”.
Em
segundo lugar, outro aspeto que me despertou interesse na exposição foi a
presença de espelhos ao logo de toda a sala expostos de maneira a que
obrigatoriamente olhemos para o nosso reflexo (e de todo o espaço que nos
rodeia). Na minha opinião estes espelhos (cortados em tiras, em forma de
cortinas) contribuem para a relação obra-observador. Este ambiente, em que
somos obrigados a interagir com o que vemos, salienta uma tomada de consciência
– a nossa presença no espaço.
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| Imagem do filme "Svyato" de Victor Kossanovsky |
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| "Rapariga com espelho, Alegoria do Amor Profano" de Paulus Moreelse |

