Adaptação cinematográfica do romance distópico de Ray
Bradbury, Fahrenheit 451, tem como título A temperatura a que os livros entram em combustão. Este filme
apresenta um futuro em que os livros são ilegais, e em que os Bombeiros se apresentam
não como uma entidade que extingue incêndios e que presta ajuda a pessoas em
situações de risco, mas sim como uma autoridade que se dedica à procura e
aprisionamento de pessoas na posse de livros e à extinção, a partir do fogo, de
todos os elementos literários em existência.
De facto, durante o filme todo, não existe nenhuma
representação de um governo autoritário, que suprime liberdades, mas este pode
ser subentendido pela caracterização da personagem Linda, mulher do personagem
principal Montag, e modo como ela vive. Percebemos, a partir da personagem
Linda, que o governo fictício define o seu poder a partir de dois elementos: a
televisão e a medicação. Linda, acredita em toda a propaganda que a televisão
apresenta, ficando fascinada e passando os dias à frente desta. Já a medicação,
pode ser subentendida, como a possível razão pela qual ela se lembrar de
eventos importantes que aconteceram (não conseguindo desta forma formular
sentimentos de oposição às forças do poder).
Porém, o filme foca-se na vida de Guy Montag, e é esta
história principal, que apresenta elementos muito pouco credíveis ou insuficientemente explorados como é
exemplo o modo como uma simples conversa desta personagem com a sua vizinha
Clarisse, o faz infringir a lei e roubar e ler um livro; também a relação de
amizade que os dois constroem, é muito pouco substanciada. Igualmente,
encontramos problemas noutros aspetos: o facto de Montag saber ler — porque é
que ele sabe ler se para todos a leitura é proibida?; o facto de haver uma
livraria dentro de casa de uma pessoa na cidade mas ninguém os ter na floresta; a
forma como chegar à floresta é bastante fácil; ou mesmo o argumento
principal do filme, que apresenta livros como elementos que nos fazem pensar, sendo
que, todavia, muitos não surtem esse efeito no ser humano podendo a escrita ser
utilizada do modo como o escritor quer, isto é, a escrita pode ser muito bem
utilizada como meio de propaganda de um regime. Da mesma forma, a progressão do
filme não é de todo bem explorada, uma vez que existe uma sensação de uma certa
falta de vida no filme, globalmente,
desde o modo como cenas de suspense são tratadas como simples acontecimentos,
como por exemplo quando Guy vê Linda a sair de casa, ao modo como as personagens
interagem e demonstram emoções, como por exemplo, a maneira como a personagem
principal é apanhada no escritório do seu chefe.
No que concerne ao seu final, apesar de se tratar de um
elemento de ficção, este acaba por descredibilizar todo o filme (que já contém
alguns problemas), levando-o de algo concebível a algo um pouco irrisório ou
fantasioso, a partir da ideia de as pessoas que se encontram na floresta
decorarem livros e se tornarem assim “pessoas-livro”.
Com uma progressão lenta, que nos faz, ainda mais,
questionar certos aspetos, este filme joga com elementos como a televisão e a
medicação, que são ainda hoje elementos de controvérsia e de certo modo
“temidos” e a ideia quase que perturbadora da proibição de livros e a sua
destruição a partir da queima, de modo a criar uma realidade que nos tenta
apenas chocar e não repensar alguma questão moral.
