sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

ANIMAIS NOTURNOS - RECENSÃO


Animais Noturnos, Nocturnal Animals no original, é um filme de 2016 realizado a adaptado ao cinema pelo cineasta e estilista americano Tom Ford, a partir do romance original Tony and Susan de Austin Wright.
A cena de abertura do filme seria por si só tema para acesos debates. Esta decorre numa galeria de arte, durante a inauguração de uma exposição da galerista Susan Morrow, interpretada por Amy Adams. As peças exibidas, da autoria do próprio Tom Ford, mostram-nos mulheres de uma obesidade mórbida, a dançar nuas apenas com alguns acessórios de majorette – chapéus, botas, plumas, confetti – transformadas numa alegoria bizarra da sociedade em que vivemos.
A narrativa do filme desenrola-se em três camadas. Uma no presente, em que Susan vive num mundo de futilidade, rodeada de pessoas ricas, belas e bem vestidas. Tem a casa perfeita, o marido perfeito e o emprego perfeito. A segunda decorre no passado, no qual ela abandona o homem que a amava verdadeiramente, Edward, um escritor em início de carreira, interpretado por Jake Gyllenhaal, para casar com alguém de uma classe económica superior, por pressão familiar. A terceira acontece no thriller que o ex-marido acabou de lançar, e que lhe faz chegar inesperadamente, dedicado a ela. Esta complexidade da ficção dentro da ficção cria um paralelismo entre a vida passada de Susan, da qual Edward sai destruído, e a ação que acontece no romance.
O título do livro, Animais Noturnos, será uma alusão à alcunha que Edward dava a Susan por ela sofrer de insónias. O enredo, uma história absolutamente desesperante, está repleto de crueldade, de morte e de angústia. Ele relata a história de uma família que em viagem de férias se vê obrigada a parar numa estrada deserta, à noite, por um grupo de criminosos liderado por Ray, interpretado por Aaron Taylor-Johnson. Mulher e filha acabam por ser raptadas, enquanto o pai, também interpretado por Jake Gyllenhaal, é abandonado no meio do deserto. Ao amanhecer Tony Hastings, o pai da família, procura ajuda. É Bobby, interpretado por Michal Shannon, um xerife com uma doença terminal e que nada tem a perder quem vai conduzir a investigação, e executar a vingança.
A partir do momento em que Susan começa a ler o livro tudo começa a mudar. Ela vai ficando crescentemente perturbada e, inevitavelmente, começa a questionar se o sentimento de perda do personagem do livro terá sido inspirado na relação passada dela com o ex-marido. À medida que o enredo avança vai crescendo o sentimento de solidão e de arrependimento em Susan.
Animais Noturnos é um filme com uma fotografia extraordinária. Os cenários começam por ser minimalistas, de cores frias, imaculados, perfeitos e vazios como a própria Susan. O contraste é notório com as cenas do romance em que a luz é quente e os cenários, densos, são repletos de textura. Paralelamente ao desenrolar da narrativa, também os cenários no mundo real, no presente, se vão tornando mais pesados e sombrios.
Os personagens são todos eles de um nível de performance excecional. Amy Adams cria uma Susan melancólica e deambulante, presa a um presente vazio e superficial e a um passado de hipocrisia. Michal Shannon, no papel do sombrio e imprevisível xerife moribundo qual alter ego de Tony Hastings. Mas são Jake Gyllenhaal, que dá corpo a dois personagens distintos, ambos atormentados pela perda, ambos à procura de vingança, e Aaron Taylor-Johnson, o cínico, desumano e repugnante antagonista do livro que maravilham e superam as expectativas.

Animais Noturnos é um filme negro, complexo e arrebatador. É um filme catarse. No livro, escrito por Edward - a camada inferior - encontramos o sentimento de vingança mais elementar e que o nosso lado indomesticado exige. Mas é no desfecho do filme - o lado consciente - deixado em aberto, que refletimos acerca da superficialidade, da futilidade e da lealdade.